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Doença de Chagas: o adoecer do coração

Conheça a realidade de quem tem esta doença considerada negligenciada

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Doença de Chagas o adoecer do coração

Descoberta por um cientista brasileiro há mais de cem anos, a doença de Chagas é considerada a mais brasileira das enfermidades tropicais. Dados da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) apontam que de 8 milhões a 10 milhões de pessoas vivem com a doença em todo o mundo. No Brasil, a estimativa é de 1 milhão a 5 milhões de pessoas, sendo que seis mil morrem por ano no país devido às complicações crônicas da doença.

O Caminhos da Reportagem, ao dar voz a pessoas que vivem com a enfermidade, pretende mostrar que a doença de Chagas não ficou no passado. Ela não foi erradicada e ainda existem pessoas sendo infectadas. A transmissão da doença pode ocorrer de três formas: pela via oral, pelo vetor e de mãe para filho. “A doença é uma infecção causada por um micróbio, um micro-organismo chamado trypanossoma cruzi, um protozoário que é transmitido por um inseto que se alimenta de sangue, que é chamado popularmente de barbeiro”, explica Rogério Gurgel, professor do Departamento de Medicina Tropical da Universidade de Brasília. A doença pode afetar o coração, o intestino e o esôfago.

A doença de Chagas é considerada uma das doenças negligenciadas, um grupo de doenças tropicais endêmicas, especialmente entre as populações pobres da África, Ásia e América Latina. Para o cardiologista e coordenador do ambulatório de doença de Chagas da Universidade de Pernambuco, Wilson de Oliveira Junior, trata-se, pela classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS), de uma doença extremamente negligenciada. “Realmente ela não é democrática, ela é extremamente antidemocrática porque atinge só a população pobre. E é uma doença que é gerada pela pobreza e que causa mais pobreza”, afirma o médico, também idealizador da Casa de Chagas, o primeiro ambulatório do mundo totalmente dedicado ao tratamento da enfermidade e ao acolhimento de pacientes.

Nossa equipe de reportagem esteve no Recife para conhecer esse ambulatório, conversar com médicos e com pessoas que vivem com a doença. Uma delas é Manoel Mariano do Nascimento, de 71 anos. Diagnosticado aos 30 anos, Manoel foi um dos fundadores de uma associação de pacientes de doença de Chagas e continua trabalhando como voluntário na Casa de Chagas. “É o prazer de ajudar meus irmãos porque muitos chegam lá chorando, aperreados”, diz.

Em Abaetetuba, no Pará, o programa conhece duas famílias que foram infectadas com a doença a partir do consumo de açaí. De acordo com o Ministério da Saúde, entre 2005 e 2013 foram registrados 112 surtos de doença de Chagas em 35 municípios da região amazônica. Desse total, 75,9% ocorreram no Pará. Viajamos também até Goiânia, capital de um dos dois estados do Brasil (o outro é Mato Grosso do Sul) que faz o teste para doença de Chagas em gestantes. É na cidade goiana que vamos explicar como a doença pode ser transmitida de mãe para filho.

O estado de Goiás também é o único do país que faz a notificação dos casos crônicos, ou seja, de pacientes que já possuem a doença há alguns anos. “Nós estamos fazendo, mas quem mais está fazendo notificação do crônico? E mesmo assim, nós notificamos quem? O crônico que nos procura. E o que não nos procura? Quem é ele?”, questiona o clínico geral Cecílio Alves de Moraes, do Hospital das Clínicas, hospital de referência para doença de Chagas em Goiás.

Além da falta de notificação dos casos crônicos, um outro problema que especialistas apontam para o cuidado dessas pessoas é a falta de conhecimento sobre a doença, tanto pela sociedade quanto pela classe médica. Essa falta de conhecimento implica em dificuldade para diagnóstico e tratamento. Uma pesquisa da organização não-governamental Médicos Sem Fronteiras Brasil, realizada em cinco cidades brasileiras em 2015, aponta que 32% dos profissionais médicos das unidades de atenção básica em saúde não sabiam oferecer o diagnóstico para doença de Chagas e menos de 14% sabiam oferecer o tratamento adequado.

Para a pesquisadora em Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Andreia Silvestre, o Brasil precisa conhecer esses indivíduos que têm doença de Chagas, saber quem são e quantos são para, a partir daí, produzir o tratamento adequado. “A gente precisa ter um olhar para esses milhões de pacientes que foram acometidos pela doença de Chagas no passado e que não receberam o tratamento adequado e que hoje têm que conviver com a doença crônica”.

 

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